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Jornalista, torcedor incondicional do Vasco da Gama e defensor ferrenho da liberdade de pensamento.

quarta-feira, 29 de dezembro de 2010


A poeira do tempo

O começo de tudo era o pó:
Rastros de cinzas no ar
Pegadas de carvão no horizonte
Desenhos de fumaça moldando o espaço

E a batuta de Deus ditando o compasso
De um resto de tempo
Incessante a passar...

E o meio de tudo ainda é o pó:
O pó da bagunça dos móveis
Dos rastilhos de pólvora
Revólveres!

O pó-de-arroz no rosto da menina
Nas construções de cimento
No refino da cocaína
Nos entulhos da cidade
A se deteriorar...

E o fim disso tudo, amigos,
No fim de tudo o destino:
Tudo o que é vivo
Se desmanchará em pó!

E assim se cumprirá a velha profecia:
Aquilo que do pó fora erguido
Ao pó fatalmente irá retornar...

domingo, 12 de dezembro de 2010


Senhora de si
(Dedicado à Nayara Ribeiro)

Sempre senhora de si
Senhora de sua vida
Tão triunfante a seguir
para a batalha da lida!

Tão satisfeita de si
Senhora de seus desejos
por que tripudias assim
Se tudo o que peço é um beijo?

Tão consciente de si
Senhora de seus costumes
O que reclamas enfim
Senhora de seus queixumes?

Tão gloriosa de si
Senhora de tantas idas
Por que não volta e sorri
Sem hora de despedida?


De Petrarca a Alencar

Não vá se prender às regras
De uma métrica perfeita
Não vá se render à sina
De uma rima regular

Só se tiver o gênio
De Petrarca até Bandeira
Se versejar nas letras
De Cecília a Alencar...

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010


Velhas Lembranças

A velha varrendo a soleira
Com a velha vassoura envergada
Pensando quão velho é o tempo
Mais velha ainda a estrada...

Relembra os velhos momentos
Da velha infância acabada
Das velhas lembranças retidas
Na velha memória cansada

Mas sabe quão velho é o tempo
Mais velha a caminhada...

Memórias de um tempo vivido
Na juventude perdida
Dos flertes, dos namoricos
Dos desfiles na avenida

E sente tão velho o tempo
Tão constante a despedida...

Poesia hipócrita

Gosto do poema que nasce
Do nada e nenhum motivo
Que tem sabor de silêncio
Mas retumba feito um grito

Gosto do poema que surge
À esmo e nenhum momento
Sentido enterrado na areia
Canção dissolvida no vento...

Prefiro o poema que nasce
Com ar de leviandade
E aroma de revelia

Desejo o poema que surge
Com jeito de juventude
E atos de rebeldia!

Soneto das inverdades

A cada volta ao passado
Uma lembrança que se eterniza
Em cada verso inacabado
Uma tristeza que se edifica

Sou o mesmo em cada traço
Dos versos que me contêm
Das palavras que me revelam
Das mentiras que me convêm

Sou versado em verso em prosa
Pra cantar em mote e glosa
Minha falsa alegoria

Vou compondo um cancioneiro
Pra provar ao mundo inteiro
Que sei fingir poesia!

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010


Teste de poesia

Escreva a palavra poema
E ponha num copo com água:

Se a palavra flutuar? É poesia escancarada!
Se a palavra derreter? É poesia açucarada...
Se a palavra encolher? É poesia envergonhada.
Se o copo arrebentar? É poesia rebelada!!!
Se a água ficar turva? É poesia amedrontada.

Porém, se afundar for seu destino,
Não é poesia. Não é nada.


O Gato

São três fios de cada lado
Cada fio contando uma história de terror:

Um de grilo mastigado
Dois de rato estraçalhado
Três de cão abandonado que cegou...

Nesse circo de horror
fiquei eu admirado:
- São tão belos os bigodes do meu gato!

Negra Flor

Toque o som dos atabaques

Se negro for...

E vista seus badulaques

Se negra for...

Transpire a oloridade

De negra flor...

E beije com a liberdade

De beija-flor!


Relembre os bravos guerreiros

Se negro for...

E cante a paz nos terreiros

Se negra for...

E ame com todo o cheiro

De negra flor...

E voe com a liberdade

De beija-flor!

r!

domingo, 5 de dezembro de 2010


O Silêncio

Percebem esse som que entorpece

Os ares, os bares, os lares?

Que antecede o sino das igrejas

E sufoca o barulho das feiras?

Que inspira a oração de Pai Nosso

E oferece honraria aos mortos?

Onipresente e constante silêncio...

Um vazio que camufla e se esconde

No alto da copa das árvores

Nas águas embaixo da ponte

No brado de dor dos doentes

Nos suspiros de amor dos nubentes

Encravado nas pedras da estrada...

Por detrás do marulho das ondas

Do “cabum” badalado das bombas

No frisson rastejar das serpentes...

Uma calma que mata e destrói

Que renasce, refaz, reconstrói!

Um silêncio incessante e inaudito

Entre o sussurro suave e o grito!



Cegueira


Se me julgas com os olhos que te cegam
O que vês é real ou ilusão?
Me persegues com palavras e com pedras
E o que tocas não tem sombra nem tem mão

Não tem corpo, não tem vida nem tem sorte
Não tem arte, nem razão, não tem por quê
Só tem asas nos teus desenhos pobres
Nas ferrugens do pensar, do mal-querer

Se me julgas com os olhos que te cegam
O que vês são teus delírios, nada mais
São vestígios do teu medo, que carregam
O furor dos teus instintos animais

Se tens medo de me ver com outros olhos
De saber do meu saber mais que ninguém
É porque tu só entendes teus simplórios
Do meu ter que te fascina e que não tens

Se me julgas com os olhos que te cegam
O que não tem mais sentido se refaz
O que não tem mais desejo permanece
E o que não tem mais futuro se desfaz


Desesperança

Tu foste a penúltima gota de sangue na veia

Marcaste o finito do tempo chegando ao fim

Riscaste o desenho no rosto do meu desespero

Fincaste o sabor do tormento de um dia ruim


Bebeste o penúltimo gole de água potável

Lavaste as mãos calejadas, sedentas de pão

Tornaste o bem saciante de vísceras secas

Em mal que alimenta a ganância do velho ladrão


Velho tempo, ladrão do destino e das esperanças

Ladrão das vitórias de outrora, das glórias sem fim

Agora semeia o tédio pesado das horas

Sepulta o resto de orgulho que havia em mim


Eu falo de desesperança de forma confusa

Cá dentro de mim é que habita o melhor sentido

Do alto do desassossego a fé não me alcança

E nesse espaço de tempo já não sei se vivo.



Incompleto

Não olhe desse jeito pra mim.

Não procure em meus olhos

Respostas insanas de questões impossíveis.

Nem procure em minha face

Resquícios de arte de um amor esquecido.


Nunca, jamais pense em mim.

Nem tampouco fale comigo.

Eu não te conheço

Não sou sequer seu amigo...

Não me faça elogios

Não critique os meus santos

Fique quieto em seu canto!

Escutando em silêncio

Com os ouvidos atentos

Ao que tento dizer a você...


Não me faça perguntas.

Não divulgue o meu nome

Não se meta comigo!

Posso ser perigoso

Ser seu grande inimigo

Ser seu carma eterno

Seu dilema maldito!

Não explique em versos

Se eu presto ou não presto

Se estou certo ou incerto

Se espanto ou se espanto

Se sou paz ou intrigas

Se verdades ou se mentiras


Fique quieto – já disse!!

Com os ouvis atentos

Nesse exato momento

Ao que devo dizer a você:


Não desejo que ponhas pedras no meu caminho

Nem mesmo que me estenda um tapete vermelho

Que me adore até o infinito

Que invada minha casa, minha estante de livros.

Que em público minha vida difame

Ou que chame em louvor o meu nome...


Ponha-se, estranho, em seu devido lugar!


Mas eu te peço que não fique distante

Pois aqui, nesse mundo infame,

Tu és a única alma

Que realmente me pode escutar!




Gosto de mulher


Melhor que adivinhar pelos teus olhos

É entrar pelos teus poros

Descobrir como tu és


Saber e vigiar os teus negócios

As tramas, os mistérios escabrosos

Temperos do teu gosto de mulher


E descobrir, por fim, qual o segredo

A causa que me dá desassossego

De me fazer feliz quando bem quer!



Aliteração

Palavras paridas do canto da boca

São palavras pífias, são palavras poucas

De papel picado, de pudor profano

Papo de poeta com pinta de malandro


Pose de portento, prata de pingente

Pano de pereba, pranto de pungente

Prego de parede, ponto de pós-parto

Parte do presente de pontos do passado


Porte de passista, preço de pulseira

Prensa de polícia, preces de princesa

Plano de político, praga de parente

Pista de perigo em passos de serpente...


Professor de português,

Proferir palavras pequenas

Passa a impressão de pessoa incapaz?


A palavra

Me confundem as tais proparoxítonas

Quando andam com suas primas mesoclíticas

Se disser “cozer-te-ei pássaros pálidos”

Eu, com fome, morrerei de proselítica!


Me devoram os neurônios as polissílabas

Com suas tetra-partezinhas dificílimas

Um vocábulo quilométrico e pragmático

Me remete aos demagogos da política!


Me agradam as resumidas monossílabas

Que reduzem de um bocado minhas críticas

Se traquejo um “sim” ou “não” sou mais simpático

Dez, cem, mil já resolvem minha dívida!


Melhor mesmo é talvez ficar calado

E viver do que pros olhos é alegria

Que mexer com a palavra é complicado

Dom dos mestres que manejam poesia...



Tempos letárgicos


Perigosa quietude que vicia

Que conforta o pensamento e desfalece

Que constrói palavras dóceis e remete

Aos porões escarnecidos da agonia


Perigoso auditório que aplaudia

O desfile patriótico dos tenentes

Sem pensar que dessa festa estava ausente

O pilar da social democracia


Perigoso acreditar ser alegria

O que é paga, como preço, a liberdade

Que é vendida como má dignidade

E ditada pela ordem dura e fria


Perigoso defender quem defendia

O silêncio secular dos insurgentes

Sem notar que a todos fazem de dementes

Num sistema de educar por letargia!